quarta-feira, 17 de junho de 2009

Metabolismo Primordial

No post anterior procurei enfatizar o estudo da vida ao nível molecular (Bioquímica), mostrei também que as grandes variações observadas nos seres vivos têm origem então, não na sua constituição, mas sim na enorme maneira com as quais os monômeros podem se combinar, e por fim como esses “constituintes” celulares foram surgindo.

Porém, o surgimento dessas moléculas orgânicas, por si só, não explica a origem da vida, como essas moléculas se “organizaram” para chegar ao nível de complexidade das células atuais, capazes de reproduzirem-se, extrair energia dos nutrientes para realizar varias funções, e poder responder ativamente a mudanças no ambiente?

No dia 7 de março de 1953, no laboratório Cavendish, na Inglaterra, Francis Crick e James Watson concluíram que a molécula do DNA tem a estrutura de uma dupla hélice, essa forma permitia o armazenamento da informação genética em uma linguagem, o ”alfabeto molecular”, onde quatro bases (nucleotídeos) exerciam o papel das letras em um alfabeto tradicional. Além disso, a informação era armazenada em duas longas cadeias, cada uma complementar a outra, esse arranjo sugeria um mecanismo para reprodução: as duas fitas da dupla hélice do DNA se separavam, e novas bases (nucleotídeos), se alinhavam ao longo das fitas separadas e as complementavam. Agora existem duas duplas hélices em vez de uma, cada uma delas uma cópia da original.

Este elegante modelo de armazenagem de informação genética, que é utilizado pelas células atuais e sua posterior reprodução, são bastante sofisticadas para terem surgido nas “primeiras células”. Vejamos: A replicação do DNA não pode ocorrer sem a assistência de uma enorme quantidade de proteínas, que trabalham com uma coordenação tão exuberante, que fazem inveja a melhor orquestra sinfônica, e essa perfeita coordenação, depende da exata tradução, no tempo e no espaço, das informações contidas no DNA. Portanto, o mais provável, é que o DNA evoluiu de uma molécula percussora, em conjunto com a necessidade da célula de adquirir uma forma de armazenar sua informação genética e reproduzir-se mais eficientemente.

As atenções voltaram-se então para uma molécula mais “versátil”, que em minha opinião precedeu o DNA e as Proteínas, o RNA. Esta molécula também é constituída de bases (nucleotídeos), que pode assumir a forma de uma dupla hélice que se assemelha ao DNA ou de um filamento único dobrado, parecido com uma proteína. A sua capacidade de armazenar informação genética já era conhecida, mas foi no inicio dos anos 80 que as moleculas de RNA mostraram suas semelhanças com as proteínas, com a descoberta das ribozimas, substancias parecidas com enzimas (catalisavam reações) e eram constituídas de RNA. Parecia que a vida tinha se originado na forma de RNA.

Nenhuma lei da Física precisa ser violada para que ocorra a formação espontânea de RNA, mas as chances contra ela são imensas. Aparentemente, a natureza inanimada tem uma tendência a formação de moléculas compostas de um número menor, e não maior, de átomos de carbono, não exibindo assim nenhuma parcialidade para a criação de nucleotídeos( que possuem vários átomos de Carbono) necessários para a vida como conhecemos. Mas a Natureza inanimada nos fornece uma variedade de misturas de pequenas moléculas com as quais trabalhar.

Usando definições termodinâmicas, podemos considerar viva uma região que decresce em entropia por meio de ciclos movidos por um fluxo de energia. Como exige a segunda lei da termodinâmica, o Universo se move em uma direção na qual a entropia aumenta. Porém, em uma área limitada a entropia pode diminuir, desde que um aumento maior ocorra fora da área limitada. Quando células crescem e se multiplicam, converte energia química ou radiação em calor, a liberação de calor aumenta a entropia fora da área limitada, compensando a diminuição da entropia na área limitada.

Uma fonte de energia é necessária para promover o processo de organização. Os microorganismos ainda usam minerais em vez de matéria orgânica ou oxigênio, indicando que esse tipo de transformação, que envolve a transferência de elétrons de uma substancia rica em elétrons, para uma substancia pobre em elétrons, com liberação de calor para o meio. Pode ter sido a primeira alternativa para obtenção de energia necessária a organização da vida. Esse tipo de transformação necessita de um mecanismo para acoplar a liberação de energia ao processo de organização que define e sustenta a vida. O acoplamento é obtido quando reações compartilham um intermediário comum e o processo é acelerado por um catalisador.

Uma rede de compostos químicos deve então ser formada, aumentando a complexidade, para possibilitar a adaptação e a evolução. Imagine, por exemplo, que a reação de transferência de elétrons de um mineral, promova a conversão de um composto orgânico A, em outra B(chamada de reação propulsora), dentro de uma área limitada. Se B se reconverter em A, ou escapar da área limitada, nós não estaríamos no caminho que leva a maior organização. Porém, se um caminho químico transforma B em C, que é convertido em D, que é reconvertido em A. Então os passos neste ciclo seriam favoráveis a uma operação continua porque reabasteceria a disponibilidade de A, permitindo a utilização continua da liberação de energia da reação de transferência de elétrons do mineral. Provavelmente essa rota primordial irá ganhar complexidade, e adquirir varias ramificações, exemplos de rotas metabólicas cíclicas são encontrados em todas as células atuais.

Por fim, essa rede deve crescer e se reproduzir. A difusão de materiais da rede para fora da área limitada é favorecida pela entropia e ocorrerá em certo grau, se estes processos ultrapassarem a taxa com que a rede ganha material, então ela será extinta. O esgotamento do combustível externo teria o mesmo efeito. Um sistema de reprodução precisa se desenvolver. Se a rede estiver abrigada dentro de uma membrana de lipídios (como as atuais) então forças físicas poderão dividi-la após ter crescido o bastante. Assim que unidades independentes forem estabelecidas, elas podem se desenvolver de formas diferentes e competir umas com as outras por matérias-primas; Acabamos de ver a transição da vida que emerge de uma matéria não viva, pela ação de uma fonte disponível de energia, para a vida que se adapta ao seu ambiente segundo a evolução darwiniana.

Esses sistemas descritos acima, que são denominados de “metabolismo primordial”, ou seja, eles não possuem um mecanismo para hereditariedade. Em outras palavras, eles não contem uma molécula ou estrutura óbvia que permite que a informação seja armazenada (sua hereditariedade) para ser duplicada e transmitida aos descendentes. Mas uma coleção dispersa de pequenos itens guarda a mesma informação de uma lista que os descreve, chamada de genoma compositivo, a hereditariedade é armazenada em moléculas pequenas, que constituem o sistema, em vez de armazenadas numa lista, como o DNA ou RNA o faz.

2 comentários:

Vinicius Parisi disse...

ola rafael
Excelentes todas as postagens. Fiz download para mostrar ao meu filho Gil que é estudante de medicina. estou lhe remetendo um email.Forte abraço, vinicius

Unknown disse...

é mais incrivel ainda pensar na formação de moleculas como o DNA e o RNA, ao decorrer da evolução, analisando-se o metabolismo das bases nitrogenadas, que é extremamente complexo e dispendioso energeticamente... a não ser que as bases existissem livres no meio acho complicado pensar nelas surgindo espontaneamente apenas por agregação aleatoria de moleculas, acho que talvez o RNA tenha surgido de oligo ou polipeptideos ja existentes. Analisando estruturalmente as bases pode-se notar semelhanças com cadeias laterais de aminoacidos aromaticos e o fato de aminoacidos serem doadores de carbonos e nitrogenios para a formação das bases no metabolismo pode corroborar essa visão. Enfim bom post!